sábado, 4 de setembro de 2010

Rosiane Mariano



Valeska Limeira Azevedo Gomes

Afonso Henrique Fávero
Aldinida Medeiros Souza
Andreia Maria Braz da Silva
Andrey Pereira de Oliveira
Antônio Fernandes de Medeiros Jr
Arandi Robson Martins Câmara
Bethânia Lima Silva
Carmela Carolina Alves de Carvalho
Cássia de Fátima Matos
Daniel de Hollanda Cavalcanti Piñeiro
Edlena da Silva Pinheiro
Eldio Pinto da Silva
Elizabete Maria Álvares dos Santos
Jackeline Rebouças Oliveira
Joana Leopoldina de Melo Oliveira
Kalina Naro Guimarães
Lígia Mychelle de Melo
Mácio Alves de Medeiros
Marcela Ribeiro
Marcel Lúcio Matias Ribeiro
Marcos Falchero Falleiros
Maria Aparecida da Costa Gonçalves Ferreira
Maria do Perpétuo Socorro Guterres de Souza
Massimo Pinna
Peterson Martins
Rochele Kalini
Rosanne Bezerra de Araujo





Rosiane Mariano [4-9-2010]

Edição: Ouro sobre Azul: RJ, 2007.

da p. 188: “O Caramuru tem os elementos tradicionais do gênero:” [...]
até a p. 190: [...] “pela falta de contato direto que a imaginação era forçada a suprir.”


O estudo de Antonio Candido, sobre frei José de Santa Rita Durão (1722-1784), concentra-se numa acurada crítica a propósito do amparo do poeta mineiro nas fontes históricas para a feitura de Caramuru (1781), já que Durão estava distante do Brasil desde os nove anos. Nas “Reflexões prévias”, tem-se a relação dos escritores que forneceram a índole nativista de seu poema, o que denota certo artificialismo de quem apenas leu sobre o Brasil, mas não o vivenciou de perto.


Na análise de Candido, a composição de Caramuru ficou restrita ao trabalho métrico de transposição das informações e das sugestões em versos. O crítico acrescenta que quando houve a tentativa de superação dos fatos históricos, que lhe serviram de referências, a imaginação tende para a prolixidade, de modo que o distancia da capacidade de síntese e de seleção dos traços essenciais, comuns à narrativa épica. Isso porque, em relação aos recursos poemáticos, Caramuru está de acordo com o esquema camoniano: dividido em dez cantos, com versos decassílabos em oitava-rima. A estrutura é convencional, inerente ao modelo clássico português: “duros trabalhos de um herói, contacto de gentes diversas, visão de uma sequência histórica” . Daí, a atribuição de ser a epopéia do frade mineiro, do ponto de vista temático e estilístico, um retrocesso. No entanto, Bosi considera Durão um passadista renitente, por “corrigir”, da linha camoniana, a presença exclusiva do maravilhoso cristão, em vez do pagão (História concisa da literatura brasileira. 1994, p. 69).


O tema de Caramuru é a ação colonizadora na Bahia: “Diogo Álvares passava ao novo descobrimento da capitania de São Vicente, quando naufragou nos baixos de Boipeba, vizinhos à Bahia. [...] Com uma espingarda matou ele caçando certa ave, de que espantados os Bárbaros o aclamaram Filho do trovão, e Caramuru, isto é, Dragão do mar.” (DURÃO. Reflexões prévias, In: Caramuru, Lisboa: Imprensa Nacional, 1836, p. 6). Episódio que o canto inicial traduz assim:

De um varão em mil casos agitado
Que as praias discorrendo do Ocidente,
Descobriu o Recôncavo afamado
Da Capital brasílica potente:
Do Filho do Trovão denominado,
Que o peito domar soube à fera gente;
O valor cantarei na adversa sorte,
Pois só conheço Herói quem nela é forte.
[p. 11]


A atualização dos dogmas católicos e a valorização da ação catequética dos jesuítas com os índios contribuem, na visão de Alfredo Bosi, para o personagem Diogo ser um “misto de colono português e missionário jesuíta, síntese que não convence os conhecedores da história, mas que dá a medida justa dos valores de Frei José de Santa Rita Durão” (1994, p. 70), seguidor de Sto. Agostinho.


As longas alusões à flora da terra e aos costumes indígenas chegam a imprimir efeitos magníficos da exuberante riqueza colonial, graças a Rocha Pita. Por outro lado, em nota, Candido diz merecer um estudo cuidadoso “este caso de aproveitamento literário, filiando-o na corrente da celebração da fauna e da flora brasileira”.


Bom, parece que Durão era passadista, também, por lançar mão daquela literatura de informação que ganhou destaque durante o Quinhentismo: período em que fontes históricas e literárias serviram de riqueza e de influência na formação de outras literaturas e de culturas em geral.


Mas, no campo temático estilístico, a questão pode ser mais ampla e aberta para o debate. O que se atribui por retrocesso pode ser o que Raymond Williams considera como residual: “Qualquer cultura inclui elementos disponíveis do seu passado, [...] certas experiências, significados e valores [...] são vividos e participados à base do resíduo” (Dominante, residual e emergente. In: Marxismo e Literatura. RJ: Zahar, 1979, p. 125).

2 comentários:

Base de Pesquisa Formação da Literatura Brasileira disse...

Mácio Alves de Medeiros comentou em 11-9-2010:
A análise de Rosiane é bem pertinente e, em relação ao Caramuru, reitera o discurso inicial de Antonio Candido quando este crítico afirma ser a literatura brasileira um galho secundário da portuguesa. Por isso, a reflexão de Santa Rita Durão pautar-se nas fontes histórias em detrimento da vivência e da proximidade com o ambiente gerador de sua obra. A escolha de Santa Rita Durão por uma estrutura convencional do modelo clássico português também reflete o deslocamento de Caramuru de qualquer tentativa mais consistente de construção de uma identidade própria para a recente literatura brasileira. Como revela o comentário de Rosiane, mesmo retratando um cenário brasileiro, a obra de Santa Rita Durão termina por ressaltar mais uma literatura de informação e relega a segundo plano a oportunidade de fazer dela parte de uma “literatura empenhada”. Mas tudo isso parece contraditório, atrevo-me a dizer, caros marujos da FORMAÇÃO, já que o Prof. Marcos Falleiros não está em Natal e deu-me de presente de aniversário a função de ser um dos comentaristas da análise feita pela colega Rosiane. Tomando exatamente o item LITERATURA COMENTADA, na análise feita pelo colega Arandi (04-10-2008), lê-se: “Antonio Candido ressalta a importância de Durão, Basílio ou Caldas Barbosa com sendo os mais voltados à temática brasileira, apesar da distância, por terem residido em Portugal”. Tal afirmação parece ir de encontro ao que disse Rosiane. Porém, lendo um e outro comentário, e lendo o que disse Antonio Candido, percebo que o crítico nem deixa Santa Rita Durão longe da sombra do juazeiro em época de estiagem como não o avisa sobre a presença de maribondos caboclos. Assim, ele compreende que os escritores brasileiros, como Durão, se sentiram “prejudicados no exercício da fantasia pelo peso do sentimento de missão” (cf. pág. 28 da ed. Ouro sobre Azul) e, por isso, transmitiram para a obra, no caso mais específico de Caramuru, o conflito entre invenção e informação, não existindo da parte do poeta, segundo Antonio Candido, um equilíbrio entre a primeira e a segunda.

Base de Pesquisa Formação da Literatura Brasileira disse...

Valeska Limeira de Azevedo Gomes comentou em 12-9-2010:

Por falar em ambiguidade, no capítulo intitulado de Estrutura literária e função histórica, no livro Literatura e Sociedade (1965), Antonio Candido, recorrendo a outro estudioso de Caramuru, Varnhagen, elege a ambiguidade como elemento fundamental na organização expressiva do Caramuru.

O momento histórico vivenciado por Santa Rita Durão motiva essa ambiguidade. Como assinalado no texto de Rosiane, o poema Caramuru está impregnado dos aspectos históricos e da doutrina religiosa do poeta. Evidenciam, assim, a convivência da modernidade do século das luzes com a tradição do período anterior.

Essas mesmas referências historiográficas, além da hiperbolização na descrição das paisagens da flora e fauna brasileiras, da celebração do indígena e do nativismo expressos no poema, no entanto, não demarcam um caráter nacionalista, ufanista. Isso é corroborado pela implementação da ideologia do colonizador, da fé católica como depuradores do índio na poesia, depois pela não-vivência e proximidade de Durão com o ambiente gerador de sua obra, como já foi apontado, e acredito que pela sua "recomposição do mundo por meio de dados tomados de segunda mão aos cronistas, para chegar a uma certa visão", versando a la Camões.