sábado, 15 de novembro de 2008

Lígia Mychelle de Melo [15-11-2008]


9ª ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 2000.
DE: p. 50: "Além desta garantia de excelência do modelo, a Antiguidade"...
[continuação de Busca de Comunicação, do cap 2 Razão e imitação]
ATÉ: p. 54: ..." por vínculo muito mais poderoso, inelutável na sua força
unificadora."
[início do Cap. 3 Natureza e Rusticidade]


A antiguidade, de acordo com Candido, oferecia também, além da garantia de excelência do modelo – que é orgulho do escritos neoclássicos –, outros apoios à teoria arcádica. Um desses apoios era o recurso da despersonalização do lirismo, graças à utilização de temas e personagens antigos (como o mito, a lenda e a história antiga), elementos da linguagem universal, como veículo da emoção. Outro apoio, oferecido pela antiguidade, era a solução de problemas da forma. A adoção de gêneros e espécies tradicionais atenua o arbítrio do autor e permite criar pontos de referência para o homem medianamente culto, propiciando e reforçando a comunicabilidade (um dos alvos do Arcadismo).



A imitação e as regras da retórica, embora tenham sido adotadas para que houvesse comunicação entre os homens, trazem, como conseqüência, a perda da capacidade de observar diretamente a vida e a visão superficial da natureza exterior e da própria natureza humana: “Note-se que a paisagem civilizada, racionalizada, da literatura arcádica é, principalmente, um escorço de paisagem da superfície da terra: árvores, prados, flores, regatos, e os animais pacíficos que nela repousam” (p.51). Candido chama a atenção para o fato de os árcades não terem sentido a magia do mar e do ar (que, posteriormente, foram povoados de magia e de mistério pelos românticos). Em outras palavras: a preocupação exacerbada com o equilíbrio e com o padrão universal acaba “excluindo” as particularidades e gerando um distanciamento do autor em relação ao que está sendo descrito e é isso que dá ao texto poético um caráter estático, superficial e sem graça. O mesmo acontece quando se trata da imitação da vida interior: “Mais do que nunca, é o tempo da psicologia do adulto, branco, civilizado e normal – à qual se procura reduzir a do próprio primitivo, do homem em estado da natureza, que era o padrão. Assim como não se desce aos subterrâneos da terra, não se baixa também aos dos espíritos” (p.52).





Capítulo 3: Natureza e rusticidade


De acordo com Antonio Candido, pode-se dizer que há em literatura três atitudes estéticas possíveis. A primeira delas é quando a palavra é considerada algo maior que a natureza, capaz de sobrepor-lhe as suas formas próprias. Trata-se de uma atitude da estética barroca. A segunda atitude é quando a palavra é considerada menor que a natureza, sendo incapaz de exprimi-la, abordando-a por tentativas fragmentárias: é o caso do Romantismo. E, por fim, há uma atitude estética em que a palavra é considerada equivalente à natureza, capaz de criar um mundo de formas ideais que exprimam objetivamente o mundo das formas naturais. Esse é ao caso do Classicismo.


Na atitude estética do Classicismo há um esforço de equilíbrio. Este é fundamentado no pressuposto de que as formas elaboradas pela inteligência se regem por leis equivalentes às leis da natureza. O belo para os clássicos, aponta Candido, está ligado à idéia de natural, de ser fiel à natureza. No entanto, essa fidelidade trouxe aos cultores da razão conseqüências imprevistas e deu lugar a combinações mais complexas. A complexidade foi, provavelmente, a característica fundamental do século XVIII, principalmente na França e na Inglaterra. Nesses dois países, o século XVIII é considerado de transição, no qual conviviam, lado a lado, blocos do passado (como o racionalismo e o conceito de que o homem nasce com certas idéias inatas) e traços característicos do século futuro (como o empirismo e a idéia de que a mente é um quadro em branco sobre o qual o conhecimento vai sendo gravado).


A chave para a compreensão das principais manifestações literárias do século XVIII deve ser buscada no tipo de racionalismo que o caracterizou. Diferentemente da razão lógica, cartesiana, de Descartes do século XVII, que se exprimia na vida social do espírito pelo senso das conveniências, o novo racionalismo setecentista – contemporâneo do empirismo e da física de Newton – é o mesmo que transparece na ordenação do mundo natural, na qual a atividade do espírito obedece a uma lei geral, que é a própria razão do universo, “unida à natureza por vínculo muito mais poderoso, inelutável na sua força unificadora”.

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